cristina buarque

Figura importante na perpetuação de obras de sambistas da velha guarda, a cantora portelense Maria Christina Hollanda Ferreira (n. 23 de dezembro de 1950) nasceu em São Paulo, filha do historiador paulista Sérgio Buarque de Hollanda e da carioca Maria Amélia Alvim Buarque de Hollanda.

Embalada pelo ambiente musical de infância - os pais tocavam piano, sua irmã Miúcha já cantava e tocava violão, e o irmão Chico Buarque estava para se tornar um dos compositores mais representativos da música brasileira -, Cristina arava, ao ouvir os sambistas antigos apresentados por seu irmão mais velho, o terreno em que pisaria anos mais tarde. Em meados da década de 60, apresentou-se com o quarteto vocal formado com as irmãs Ana Maria e Maria do Carmo (Piii), e a amiga Helena, em colégios, programas de televisão e, às vezes, acompanhando o irmão compositor.

Gravou pela primeira vez em 1967, registrando “Chorava no meio da rua” no LP Onze sambas e uma capoeira (Discos Marcus Pereira), que trazia somente músicas de Paulo Vanzolini. No ano seguinte participou do terceiro LP de Chico Buarque (Chico Buarque de Hollanda - Volume 3, RGE), cantando com ele “Sem fantasia”.

Seu primeiro LP, Cristina, lançado pela RCA em julho de 1974, revelou o sucesso “Quantas lágrimas”, samba do portelense Manacéia, comercializado posteriormente em compacto simples. Nesse período, quase sempre convidada pelo produtor de seus três primeiros discos, Fernando Faro, apresentou-se em programas da TV Cultura, de São Paulo, como o MPB Especial.

Em 1976 gravou o LP Prato e faca (RCA Victor), com sambas de Miginha (“Chega de padecer”), Alberto Lonato (“Não pode ser verdade”), Bubu e Jamelão (“Esta melodia”), Paulinho da Viola (“Abra seus olhos”), Dona Ivone Lara (“Dei-te liberdade”), Manacéia (“Sempre teu amar” e “Carro de boi”) e outros. No ano seguinte, pontuou os discos Tiro de misericórdia (RCA Victor), de João Bosco, na faixa “Vaso ruim não quebra” (Aldir Blanc e João Bosco), e Pelas ruas (EMI-Odeon), de Carlinhos Vergueiro.

Em 1978, gravou pela Continental o LP Arrebém, com destaque para as faixas “Vida” (Elton Medeiros e Paulinho da Viola), “Flor da Lapa” (César Brasil e Wilson Batista), “Vai que depois eu vou” (Geraldo Pereira), além das participações de suas irmãs Miúcha e Piii em “Você só... mente” (Hélio Rosa e Noel Rosa), e da Velha Guarda da Portela na faixa “Muito embora abandonado” (Mijinha e Francisco Santana).

Em 1979, dividiu o microfone com Clementina de Jesus na faixa “Tantas você fez”, de Candeia, na gravação do disco Clementina e convidados (EMI-Odeon), produzido por Fernando Faro. Participou também da Turma do Funil, gravando “Se eu fosse o teu patrão”, de Chico Buarque, no LP Ópera do malandro (Polygram, 1979), trilha sonora da peça homônima.

No início da década de 80 gravou mais dois discos de carreira. Vejo amanhecer (Ariola, 1980), álbum encabeçado pela faixa-título de Noel Rosa e Ataulfo Alves, contou com o regional Época de Ouro na música “Cantar” (Godogredo Guedes) e ainda registrou três composições de Cacaso e Novelli (“A madastra”, “Triste Baía da Guanabara” e “Andorinha”). Cristina, de 1981 e lançado novamente pela Ariola, trouxe a Velha Guarda da Portela (“Vida de rainha”, de Alvaiade e Monarco) e Clementina de Jesus (“Quando a polícia chegar”, de João da Bahiana). Ainda em 81 participou do disco Geraldo Pereira - Evocação V (Eldorado) gravando “Pode ser?” (Geraldo Pereira e Marino Pinto).

Em 1985, ao lado do amigo e parceiro Mauro Duarte, o Bolacha, gravou pelo selo Coomusa (Cooperativa Mista dos Músicos Profissionais do Rio de Janeiro) o independente Cristina e Mauro Duarte, nunca editado em CD. Neste, Bolacha fez a letra de “Reserva de domínio”, música de Paulo Cesar Pinheiro, que participou da gravação da faixa. E o clássico de Manacéia, “Quantas lágrimas”, foi novamente gravado, desta vez integrando um pot-pourri. E no LP As flores em vida - Nelson Cavaquinho (Eldorado), que produziu com Carlinhos Vergueiro, gravou “Aquele bilhetinho” (Nelson Cavaquinho, Augusto Garcez e Wilson Canegal).

Cristina voltou ao estúdio em 1987 para registrar em compacto duplo, novamente em produção independente e ao lado de Mauro Duarte, as músicas “Resgate” (Mauro Duarte e Paulo Cesar Pinheiro) e “Deixa eu viver na orgia”, composta com Mauro. E nos dois anos seguintes, participou do LP Candeia (Funarte, 1988) interpretando “Morro do Sossego” (Candeia e Artur Poerner), e Homenagem a Paulo da Portela (Idéia Livre, 1989), álbum da Velha Guarda da Portela lançado originalmente no mercado japonês pelas mãos do produtor Katsunori Tanaka, quando cantou ao lado de Mauro Duarte “Quem espera sempre alcança”.

Logo na entrada da década de 90, Cristina mostrou sua rara veia compositora. Com Lefê e Mauro Duarte confeccionou “Marcha da saideira”, registrada no disco Bloco carnavalesco Simpatia é Quase Amor - 5 anos de samba em Ipanema (1990). Ainda em 1990, gravou para o mercado japonês o CD Resgate, que contou com as participações de Monarco, Manacéia, Velha Guarda da Portela, Orquestra de Cordas e Paulo Cesar Pinheiro. Regaste foi lançado no Brasil (com mil cópias iniciais) somente em 1994 por iniciativa da SACI (Sociedade dos Artistas e Compositores Independentes), selo dos músicos cariocas Maurício Tapajós e Maurício Carrilho.

Em 1995, participou do CD Estácio & Flamengo - 100 anos de samba e amor (SACI), e juntamente com Henrique Cazes, gravou o CD Sem tostão... a crise não é boato, inteiramente dedicado à obra de Noel Rosa.

Em 1997 a Som Livre lançou Agô Pixinguinha, álbum duplo produzido por Herminio Bello de Carvalho que brindou o centenário de nascimento de Alfredo da Rocha Vianna Filho (1897-1973), o Pixinguinha. Com participações de Chico Buarque, Paulinho da Viola, Maria Bethânia, Caetano Veloso, entre outros, e registros de Jacob do Bandolim e do próprio Pixinguinha, o disco trouxe Cristina e Sérgio Ricardo interpretando o clássico “Vou vivendo” (Pixinguinha, Benedito Lacerda e Herminio Bello de Carvalho).

Nesse ano, emprestou sua voz ao disco Chico Buarque de Mangueira (BMG), cantando com João Nogueira um pot-pourri formado por “Linguagem do morro” (Padeirinho e Ferreira dos Santos), “Favela” (Jorge Pessanha e Padeirinho) e “O samba do operário” (Nelson Sargento, Cartola e Alfredo Português); e com Carlinhos Vergueiro a seleção composta por “Como será o ano 2000?” (Padeirinho), “Cabritada malsucedida” (Geraldo Pereira e Wilton Wanderley), “Polícia no morro” (Geraldo Pereira e Arnaldo Passos) e “Agoniza mas não morre” (Nelson Sargento).

Em agosto de 1998, juntamente com Monarco, apresentou no SESC Ipiranga, em São Paulo, o espetáculo Noel Rosa sobe o morro, com sambas do poeta da Vila compostos em parceria com Ismael Silva (“Ando cismado”), Cartola (“Não faz, amor”), Bide ("Fui louco”), entre outros. Com o disco Eterna chama - Candeia 20 anos, vocalizou “Vem pra Portela” (Coringa e Candeia) e “Luz de verão”. Este samba foi recuperado de uma de suas fitas gravadas na casa do Candeia nos anos 70 e que mais tarde ganhou letra de Marquinhos de Oswaldo Cruz. Também em 1998 voltou a fazer um dueto com o irmão Chico Buarque na faixa “Injuriado” do disco As cidades (BMG).

Em agosto de 1999 participou do Boteco do Cabral que homenageou a Portela. Realizado no SESC Pinheiros, em São Paulo, e apresentado pelo pesquisador e jornalista Sérgio Cabral, o Boteco contou também com as presenças de Monarco e da Velha Guarda. E em dezembro gravou no Estúdio Musidisc, no Rio de Janeiro, “Quando o samba acabou” (Noel Rosa) e "Vaidade de um sambista” (Chico Santana), músicas que integraram o CD Mangueira & Portela - Velhas companheiras, produzido por Katsunori Tanaka e lançado no Brasil pela Nikita Music no ano seguinte.

Encerrando um jejum de cinco anos, Cristina lançou em 2000 mais um álbum de carreira, desta vez celebrando o sambista fluminense Wilson Batista (1913-1968). Produzido por Herminio Bello de Carvalho, o CD Ganha-se pouco, mas é divertido (Jam Music) contou com as presenças de Chico Buarque, Paulinho da Viola e do veterano Roberto Silva, e deu novo frescor a sambas como “Sambei 24 horas” (Wilson Batista e Haroldo Lobo), “Deixa de ser convencida” (Wilson Batista e Noel Rosa) e “Louco (Ela é seu mundo)” (Wilson Batista e Henrique de Almeida), além de revitalizar o personagem Laurindo no pout-pourri formado por “Lá vem Mangueira”, “Cabo Laurindo” e “Comício em Mangueira”.

Mais uma vez grifando sua paixão pela Portela, participou do álbum Tudo azul (Phonomotor/EMI, 2000), da Velha Guarda da Portela, cantando “Minha vontade” (Chatim). E em 2001, com o cavaquinista Henrique Cazes, gravou ao vivo no Bip-Bip, no Rio de Janeiro, Sem tostão 2... A crise continua (Kuarup), com repertório centrado, em sua maioria, na obra de Noel Rosa.

Em 2002, Cristina participou do projeto O samba é minha nobreza dirigido por Hermínio Bello de Carvalho. O show reuniu novos e velhos intérpretes em um panorama histórico do samba desde seu começo. Junto com Cristina estavam Roberto Silva, Teresa Cristina, Mariana Bernardes, Pedro Miranda, Paulão e Zé Cruz. O show virou CD duplo e saiu no mesmo ano pela Biscoito Fino. Dois anos depois, seu segundo disco, Prato e faca, saiu finalmente em CD. O ano de 2005 trouxe mais um disco em que Cristina se juntou a artistas da nova geração do samba carioca para mostrar sua permanente vitalidade. O disco se chamou Estação Lapa vol. 1 (Deckdisc) e Cristina participou cantando “Derramando lágrimas” (Alvarenga e Délcio Carvalho) ao lado da Velha Guarda da Portela.

Sempre discreta, Cristina seguiu fazendo shows aqui e ali (leia-se Rio de Janeiro e São Paulo). Em 2007 esteve em uma faixa (“Portela na avenida”) no disco Estação Lapa vol. 2 (Deckdisc), participou como backing vocal das gravações e shows do Paulinho da Viola - Acústico MTV (Sony BMG) e emplacou uma série de shows ao lado do grupo de samba paulistano Terreiro Grande, no recém-criado Teatro Fecap, que acabou virando o CD Cristina Buarque e Terreiro Grande ao vivo (Dançapé). No repertório, Zé da Zilda, Alvaiade, Paulo da Portela, Miginha, Heitor dos Prazeres, Cartola, Monarco e Chico Santana, entre outros. Mal lançou o disco entrou em estúdio ao lado do grupo carioca Samba de Fato (Alfredo Del-Penho, Pedro Miranda, Pedro Amorim e Paulino Dias) para gravar canções inéditas e/ou pouco conhecidas do saudoso amigo Mauro Duarte. Em fevereiro de 2008 foi lançado o disco duplo O samba informal de Mauro Duarte (Deckdisc).

fonte: Ricardo Tacioli


Cristina Buarque e Terreiro Grande numa roda de samba em Paquetá (RJ)

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